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Expressão de sentimentos e adoecimento

 


 

Falar de si, sobre seus sentimentos ou suas emoções pode ser um exercício desafiador ou até mesmo apavorante para muitas pessoas. Realmente a habilidade de entrar em contato com seus sentimentos não é algo tão simples de se adquirir e exige aprendizado, esforço e experimentação. A sociedade, através das instituições familiares, escolares, judiciarias, etc., tende a não incentivar as formas mais autênticas de se expressar reprimindo e ignorando sentimentos negativos. Expressar-se pode prevenir transtornos mentais graves e contribuir para um funcionamento equilibrado diante da vida. Já reprimir e negar sentimentos pode ser um caminho curto até o adoecimento físico e/ou mental e vou discorrer mais sobre o porquê acredito nessa visão psicossomática.

A visão de um indivíduo como um todo é milenar. Hipócrates (460 a.c.) já observava a doença como um desequilíbrio nos humores corporais e correlacionou a doença física com as disposições naturais ou o temperamento do doente. Atualmente são inúmeros os estudos científicos que exploram a relação corpo-mente nos processos de saúde e doença. As inúmeras especializações que foram desenvolvidas pela medicina podem ter contribuído para uma ideia de divisão entre o corpo e a mente, mas na verdade ambos dependem um do outro.

O corpo que fala é o mesmo corpo que ouve. É no corpo que acontece as experiências e é nele que é guardado o eu e a personalidade. Pesquisadores importantes como Dethlefsen e Dahlke concluíram que em muitos casos a pessoa vive através dos sintomas de determinado adoecimento aquilo que ela evitou tomar consciência. Esses pesquisadores ainda nos mostram que o corpo tem um modelo harmônico entre várias funções. Quando uma dessas funções deixa de funcionar essa harmonia é comprometida e surgem as doenças.

A fala é um dos melhores caminhos para a ampliação da autoconsciência. Ter consciência daquilo que se passa na mente, na experiência e na memória, evita a necessidade de o corpo ter que agir por você. A fala também é um dos melhores caminhos para elaborar e expressar seus sentimentos, mas não é único. O corpo manifesta suas sensações, seus gestos, e lhe provoca humores através de reações químicas e você pode escutá-lo. Não tem uma manha ou jeito certo de se fazer, mas é preciso parar um pouco para focalizar a consciência nessas ocorrências internas. Direcionar a consciência para as sensações, emoções, humor, sinais corporais e continuar observando os sentimentos em torno delas. Parar e desacelerar pode ser um grande problema em uma época tão acelerada e movimentada, mas mais necessário que nunca. Afinal, estamos sendo atravessados o tempo todo por inúmeras emoções e correndo só se vê vultos, fragmentos, e nunca uma imagem limpa.

  A dificuldade de reconhecer e expressar aquilo que se sente pode estar associada a um ambiente em que os sentimentos e as emoções não eram legitimados e reconhecidos pelos adultos ou ainda às violências simbólicas que impedem a pessoa de ser “sentimental”, como ocorre muito com a população masculina ou famílias muito rígidas. A pessoa que se sente perdida diante dos sentimentos pois não aprendeu a acolhê-los e reconhecê-los, pode experimentar esse contato consigo para perceber algo em si e comunicar para os outros ou até para si mesmo.

Finalizando, sentir todas as coisas e sensações que nos atravessam são essenciais para evitar que as vivências reprimidas se somatizem no corpo. Entrar em contato e expressar seus sentimentos é bom não só para quem expressa, como também para os seus relacionamentos. Aliás, quem não consegue sentir todas as suas emoções e sentimentos, acabam se expressando sempre através da raiva e do ressentimento.

Expresse seus sentimentos às pessoas que lhe são importantes da forma mais genuína que conseguir e não deixe de buscar a psicoterapia como facilitadora desse processo de crescimento e autoconhecimento. Falar dentro de uma atmosfera segura e acolhedora tem efeitos potentes na elaboração e organização dos sentimentos e promove mudanças significativas no jeito de ser das pessoas.

Com carinho,

Tiago Henrique - Psicólogo.

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