Você acorda todo dia e quando
se percebe está na cozinha tomando café, se preparando para a lida, entrando em
um modo automático realizando um ritual diário aprendido. Tem à frente mais um
dia de trabalho ou de tarefas. Ora ansioso para cumprir o ritual, ora
desanimado com sua rotina. A pessoa diante de uma vida automatizada e sem gosto
se cansa, se entristece e pode se deprimir. Começa a experimentar momentos de
angústia que parecem sufocar a paz de espírito. Deseja mudanças, mas não sabe
como fazê-las ou se convence de que não há o que se fazer.
A maioria das pessoas
tem dificuldade de clareza daquilo que as desmotivam, que as incomodam, que
angustia. As prioridades com o trabalho, com os filhos, com as contas, etc.,
parecem, frequentemente, orientar e justificar suas escolhas e atitudes. Nesse
modo de vida automático e acelerado o sentimento de urgência parece estar
sempre presente, motivando escolhas pessoais e profissionais que, por vezes,
são tomadas sem a devida consciência. É muito cômodo e confortável deixar-me
levar pela falsa sensação de liberdade de escolha que o cotidiano impõe.
Um exemplo caricato
seria escolher o curso de graduação que meus pais sonharam para mim ou alegar
que não tenho tempo para realizar algo que me faria sentido porque tenho que
focar no meu papel de pai ou me dedicar exclusivamente ao trabalho como forma
de prover o lar. Claro que a sociedade nos cobra muito trabalho e compromisso
que acabam nos exaurindo, porém, podemos sempre repensar e reconfigurar nossa
relação com a sociedade e buscar equilíbrio. Mas como disse, não escolher ou deixar
que escolham por mim, livra-me das dores advindas das escolhas e posso culpar e
responsabilizar o outro, me livrando do sentimento da culpa e da frustração.
O que quero debater diz
respeito a esse cenário em que as pessoas se sentem perdidas de sentido com a
vida que leva no oceano do cotidiano e dos traumas das relações, mas não
conseguem mudar sua realidade e viver uma vida mais satisfatória. Não conseguem
contemplar escolhas que as ajudem nesse processo. Afinal, escolher não é tão
simples. O existencialista Jean-Paul Sartre tem a liberdade como tema central
na tentativa de entender o humano. Para ele o homem está condenado a ser livre
e sua existência deriva desta condição.
O fato é que acostumamos
aceitar de bom grado valores e modelos prontos dispostos nas estruturas sociais
porque nos angustiamos diante da nossa liberdade. Sartre disse que frente a uma
decisão, o homem percebe seu total desamparo, pois não há nada que possa
livrá-lo da tarefa de escolher, nada pode salvá-lo de si mesmo.
Uma
vida completamente feliz não existe e peço desculpas pelo realismo, mas existe
sim a possibilidade de uma vida plena, consciente e boa. Para tanto, é preciso viver
nossa condição de ser livre e assumir a responsabilidade pela mudança que é
desejada por mais angustiante que possa ser descontruir ou repensar os
fundamentos prontos que amenizam o peso da responsabilidade das escolhas. Para
Sartre, é na sua liberdade de escolha que deve fundamentar seu agir e construir
o seu ser, afinal, a existência precede a essência, já que a priori não somos
nada, não nascemos com manuais de instrução. Ou seja, só por meio das nossas
ações intencionalmente conscientes podemos ser representados como sendo alguma
coisa. A angústia faz parte da vida e aprender a lidar com ela nos desenvolve
como indivíduos livres e íntegros.
Comentários
Postar um comentário